Mateus Pasa1, Horacy Fagundes da Rosa Júnior2; Ezequiel Pasa1; Filipe Selau Carlos1 Lizete Stumpf1 - (1Universidade Federal de Pelotas; 2Pecanera Brasil)
O interesse pelo cultivo da nogueira-pecã (Carya illinoinensis) vem crescendo fortemente no Sul do Brasil, respaldado pelo aumento do consumo e do preço de mercado. No entanto, um dos grandes entraves para a expansão da pecanicultura é o longo período entre o plantio e o início da colheita, ou seja, de retorno econômico do investimento. Atualmente, essa lacuna tem sido preenchida principalmente pela criação de bovinos de corte durante o inverno, período em que as plantas estão em repouso vegetativo. No entanto, é importante que existam outras alternativas para que o produtor possa decidir qual a que melhor se adequa ao seu perfil investidor. Nesse sentido, o cultivo de espécies anuais para a produção de cereais de inverno nas entrelinhas seria uma alternativa para gerar renda nos primeiros anos de estabelecimento do pomar. Porém, as informações sobre esses sistemas na região Sul do RS e mesmo no Brasil, são escassas, necessitando de trabalhos de pesquisa para verificar o desempenho das culturais anuais, bem como das plantas de nogueira-pecã.
Dentre as espécies anuais de inverno para utilização no sistema agroflorestal, destaca-se o trigo, pelo fato de ser a espécie anual de inverno de maior importância econômica no Brasil. Porém, outras espécies como centeio também apresentam potencial. O centeio é uma espécie com características de rusticidade, crescimento inicial vigoroso, resistência ao frio, ao déficit hídrico, a acidez do solo e a baixa fertilidade do solo merecendo destaque para utilização nos sistemas agroflorestais.
Nesse sentido, tem sido desenvolvido um experimento em parceria com a empresa Pecanera Brasil, para verificar o desempenho de cereais de inverno em sistema agroflorestal com nogueira-pecã, bem como a qualidade do solo nesses sistemas.
A área do experimento encontra-se localizada em Encruzilhada do Sul, na empresa Pecanera Brasil (30°37'54.93"S; 52°41'9.18"O). Em abril de 2022 foram selecionadas as plantas de nogueira-pecã para implantação do experimento. Foram selecionadas plantas da cultivar Barton, plantadas no inverno de 2018. As plantas foram selecionadas visualmente por tamanho de copa, desenvolvimento da parte aérea e estado fitossanitário, de maneira a apresentarem condições semelhantes para todos os tratamentos.
A semeadura das culturas de inverno foi realizada em 20/07/2022, a qual está de acordo com as recomendações do Zoneamento Agrícola de Risco Climático para a cultura do Trigo no estado do RS (Portaria SPA/MAPA Nº609, de 16 de dezembro de 2021). Inicialmente foi planejado realizar a semeadura em linha, porém, no inverno de 2022 choveu acima da média na região, dificultando a entrada de máquinas nas áreas, razão pela qual optou-se por realizar a semeadura à lanço. Além disso, em conversa com o gerente da empresa, surgiu o questionamento sobre a viabilidade de se utilizar a semeadura em linha em áreas de nogueira-pecã, pelo menos em um primeiro momento, uma vez que as fazendas com foco na nogueira-pecã dificilmente terão semeadoras em linha disponíveis. Então, em um primeiro momento, o investimento em semeadoras em linha seria inviável nesses casos, sendo que as primeiras experiências pelos produtores com cultivos de inverno seriam realizadas com semeadura com distribuidor de sementes à lanço (ciclone).
As cultivares semeadas foram OR Feroz (trigo; ciclo precoce) e IPR 89 (centeio; ciclo médio). A quantidade de sementes utilizada foi ajustada para uma população final de 300 plantas por m2, sendo equivalente a 150 kg ha-1 e 100 kg há-1 de sementes para o trigo e centeio, respectivamente. As sementes foram distribuídas em uma área de 100 m2 (área de cada parcela) ao redor de cada planta selecionada, ou seja, a planta ficou ao centro e se mediu 5 metros de distância dela na direção de cada quadrante (Figura 1). Nas linhas da nogueira-pecã a área não foi submetida ao preparo com grade de disco (1 metro de cada lado), mas foi semeada igualmente. A população de plantas foi aferida em 11/08/2022, [22 dias após a semeadura (DAS)], em uma porção representativa da área de 1 m2 (Tabela 1).
Figura 1. Área de distribuição das sementes na parcela. Círculo verde ao centro representa a planta de nogueira-pecã. Faixa verde claro no centro da figura representa a porção de 1 m em cada lado da linha de plantio da nogueira-pecã que não foi submetida ao preparo com a grade de disco, mas foi semeada com igual densidade de sementes.
Tabela 1. População de plantas de trigo e centeio aos 22 dias após a semeadura. Encruzilhada do Sul, 2022.
A população ficou abaixo da inicialmente projetada, possivelmente pelo elevado volume de chuvas após a semeadura que prejudicou o estabelecimento inicial. Porém, ambas as espécies têm potencial de compensar a menor população inicial estabelecida através do perfilhamento. A figura 2 mostra as culturas na fase inicial de estabelecimento em 11/08/2022.
Figura 2. Centeio e trigo na fase inicial de estabelecimento em integração com a nogueira-pecã. Agosto, 2022. Foto: Horacy Fagundes da Rosa Júnior.
A colheita para determinação do rendimento foi realizada em 08/12/2022, onde foram colhidas duas porções de 2m2 (1 x 2m) de cada parcela, uma em cada lado da linha de plantio da nogueira-pecã (Figura 3).
Figura 3. Parcela de trigo no momento da colheita. Foto: Mateus Pasa
Tabela 2 (abaixo). Produtividade de trigo e centeio em integração com a nogueira pecã. Dezembro, 2022.
*Valores estatisticamente diferentes de acordo com a análise de variância e teste de médias (p <0.05).
1Preço do Trigo Pão, PH 78, Tipo 1 (60 kg) em 09/12/22 (CONAB): R$ 88,45; Preço do Centeio (60kg) em 05/12/22 (Agrolink): R$ 102,00
A produtividade foi maior com o trigo do que com o centeio (Tabela 2). O trigo é um espécie com potencial produtivo maior do que o centeio em condições adequadas de cultivo. Além disso, também apresenta um processo de melhoramento genético mais intenso para obtenção de materiais produtivos em relação ao centeio, pois é um cultivo de maior interesse econômico. Mesmo sendo maior que o centeio, a produtividade do trigo foi menor que a média para o estado do Rio Grande do Sul nos últimos 10 anos (2.624,5 kg ha-1) (CONAB, 2023). Isso ocorreu principalmente pelo grande volume de chuvas durante essa safra que prejudicou principalmente o estabelecimento inicial das plantas na área. Vale destacar que o centeio é uma espécie interessante para níveis de investimento menores, devido ao fato de ser uma espécie mais rústica conforme já mencionado anteriormente, podendo ser uma alternativa também para áreas com menor fertilidade natural dos solos. Além disso, façamos uma comparação com o rendimento bruto que ter-se-ia com bovinos de corte. Vamos considerar um ganho de 160 kg ha-1 de Maio a Setembro na área de nogueiras-pecã e um preço médio de R$ 10,00 por kg vivo. Ressalta-se que a área está corrigida de acordo com as recomendações de adubação e calagem baseadas em análise química realizada na implantação do pomar e a pastagem é constituída por forrageiras nativas e azevém sobressemeado sobre a pastagem nativa. Sendo assim teríamos um rendimento bruto de R$ 1600,00 no período, que foi semelhante ao centeio e inferior ao trigo. É fundamental salientar que o cultivo do trigo ou centeio seria mais uma opção para aumentar a eficiência do sistema, e não uma alternativa para substituir a pecuária. Assim, se por alguma razão os preços da carne estejam pouco atrativos poder-se-ia investir no cultivo do trigo, e vice-versa.
Os resultados iniciais mostram um grande potencial dos cereais de inverno, principalmente o trigo para o sistema integrado com nogueira-pecã nas fases iniciais do cultivo. O estudo continuará sendo conduzido na próxima safra, para verficiar a consistência dos resultados obtidos. Além disso, ainda serão realizadas avaliações químicas e físicas do solo de cada tratamento, bem como de desenvolvimento e produção das nogueiras-pecã.
Agradecimentos
À Fundação Agrisus pela concessão de auxílio financeiro e à Pecanera Brasil pela disponibiização da área e estrutura para realização do estudo.
Referências
CONAB. Série histórica de safras > Trigo. Disponível em: https://www.conab.gov.br/info-agro/safras/serie-historica-das-safras/itemlist/category/913-trigo. Acesso em: 19 de Fev. 2023.
MAPA. Portaria SPA/MAPA Nº 609, de 16 de dezembro de 2021: Aprova o Zoneamento Agrícola de Risco Climático para a cultura de trigo de sequeiro no Estado do Rio Grande do Sul, ano-safra 2021/2022. 2022. Disponível em: https://www.gov.br/agricultura/pt-br/assuntos/riscos-seguro/programa-nacional-de-zoneamento-agricola-de-risco-climatico/portarias/safra-vigente/rio-grande-do-sul/word/PORTN609TRIGODESEQUEIRORS.ret.pdf Acesso em: 15 de Ago. 2022.
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