Entre as ações do programa Pecan 2030, que conta com a parceria tecnológica
da Embrapa, destacam-se unidades de referência produtiva (URPecans)
O programa setorial Pecan 2030 foi concebido pelo Instituto Brasileiro de Pecanicultura
(IBPecan) e, de imediato, ao ser convidada, a Empresa Brasileira de Pesquisa agropecuária (Embrapa) aceitou o desafio de contribuir na dimensão de pesquisa e desenvolvimento para sua implementação. Assim, em junho de 2021, foi assinado um acordo de cooperação técnica e institucional para execução de trabalhos de pesquisa com a cultura, buscando focar no desenvolvimento e na adoção das boas práticas agrícolas (BPAs), nas bases de programas de certificação e no suporte técnico a políticas
públicas de interesse para a cadeia da pecanicultura brasileira, além de demandas pontuais de pesquisas que possam surgir durante a vigência da parceria. O Pecan 2030 é uma iniciativa crucial para identificar e superar os desafios para que o setor se torne ainda mais competitivo nos próximos anos, com vistas ao mercado nacional e à conquista de novos espaços no mercado internacional. Uma das iniciativas em andamento dentro do programa é a instalação das URPecans, unidades de referência produtiva. Trata-se de modelos físicos de sistema de produção de noz-pecã em propriedades localizadas nas principais regiões produtoras do Rio Grande do Sul. Têm como objetivos o acompanhamento, a validação de práticas e manejos, a avaliação experimental e a demonstração e transferência das tecnologias geradas.
Nesta entrevista, o assunto é aprofundado pelo engenheiro agrônomo Carlos Roberto Martins, pesquisador de fruticultura sustentável na Embrapa Clima Temperado. Ele é mestre, doutor e tem pós-doutorado em agronomia. Também atua como professor e orientador do programa de pós-graduação em agronomia/fruticultura de clima temperado da Universidade Federal de Pelotas (UFPEL).
Desde a assinatura do acordo de cooperação técnica entre Embrapa e IBPecan, o que foi concretizado e quais os resultados já alcançados pelo Pecan 2030?
Mais do que um projeto, Pecan 2030 é um programa que contempla o desenvolvimento setorial como um todo, com ações estratégicas para melhorar a produtividade, a qualidade e a rentabilidade da produção de pecan. De uma certa forma, sinaliza à Embrapa a importância que a cadeia produtiva tem no segmento da fruticultura e, principalmente, aponta para a necessidade de esforços da pesquisa brasileira para com o setor. A proposta Pecan 2030 foi construída durante a pandemia, o que exigiu um esforço gigantesco para sua consolidação e institucionalização na Embrapa. Um dos primeiros resultados foi a própria formalização da parceria de forma legal diante dos aspectos regulatórios de uma empresa pública como a Embrapa.
Também foi estabelecido um comitê gestor, composto por pesquisadores da Embrapa e diretores do IBPecan, que busca operacionalizar as ações da parceria. É importante ressaltar que o Pecan 2030 envolve uma equipe de pesquisadores da Embrapa com suas especialidades que poderão se dedicar na busca de soluções tecnológicas para a cultura. A formalização da participação da Embrapa foi decisiva para que possamos contribuir de forma mais efetiva em nossas áreas de conhecimento e ajudar o programa Pecan 2030 a ter o sucesso almejado. E isso vai muito além da tecnologia em si. Por exemplo, foi feito, ainda, um trabalho técnico com recomendações e sugestões por consulta pública – Portaria nº 323/2021 da Secretaria de Defesa Agropecuária (SDA) do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) – que culminou com o estabelecimento do regulamento técnico que define os requisitos mínimos de identidade e qualidade para amêndoas, castanhas e nozes-pecã publicado na forma da Portaria SDA n° 635, de 5 de agosto de 2022. Além disso, houve apoio a políticas públicas com a formalização de um grupo de trabalho para tratar da criação de subcomitê de produção de mudas de noz-pecã na Comissão de Sementes e Mudas do Rio Grande do Sul (CSM/RS), ligada à Superintendência Federal de Agricultura, Pecuária e Abastecimento do Rio Grande do Sul (SFA/RS). Mais uma iniciativa foi a participação no Grupo de Trabalho Minor Crops Brasil, que trata da busca, junto a órgãos competentes e empresas, de produtos químicos e da articulação para ampliar as opções de produtos químicos sintéticos e biológicos registrados para a nogueira-pecã, que é uma cultura estabelecida dentro das culturas de suporte fitossanitário insuficiente (CFSI). Aliás, a própria inserção da nogueira-pecã nos aspectos das CSFI do MAPA já foi uma ação construída em parceria com várias entidades como IBPecan.
Como o desenvolvimento de pesquisas demanda recursos financeiros, temos buscado identificar oportunidades em agências de fomento à pesquisa. Uma delas foi a proposta de projeto de pesquisa encaminhada ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Outra proposta de projeto foi encaminhada à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul (FAPERGS). Ambas foram aprovadas, mas contingenciadas por causa da falta de recursos públicos na oportunidade. Uma terceira proposta foi entregue ao IBPecan, na forma de Termo de Execução Descentralizada (TED), para ser encaminhada às lideranças representativas do setor no âmbito da política estadual e federal. São oportunidades essenciais para que se possa viabilizar de forma significativa as ações de pesquisa e o atendimento das demandas do IBPecan. Nesse sentido, uma das principais conquistas foi a aprovação, na programação oficial da Embrapa, do projeto e pesquisa denominado ‘Bases tecnológicas para ‘Bases tecnológicas para qualificação e certificação na cadeia produtiva da pecanicultura’.
Este projeto é conhecido, de uma forma mais simples, como projeto das URPecans, em que o das URPecans, em que o IBPecan é financiador parcial e a Fundação de Apoio a Pesquisa e Desenvolvimento Agropecuário Edmundo Gastal (FAPEG) contribui no gerenciamento dos recursos.
Detalhe os objetivos e em que estágio se encontram as URPecans?
O objetivo desse acordo consiste em caracterizar a cadeia produtiva da pecanicultura no Rio Grande do Sul quanto aos aspectos técnicos, econômicos e sociais, identificando e sistematizando informações que resultem na proposição, sensibilização e capacitação
para que protocolos de produção, certificação e rastreabilidade, alinhados às exigências nacionais e internacionais, produção sustentável da pecan. Em síntese, a iniciativa consiste em propor ações de pesquisa, desenvolvimento e transferência de tecnologia de forma integrada e sinérgica com produtores vinculados ao IBPecan. Com base em informações coletadas nas URPecans (unidades de referência produtiva), talhões representativos de áreas comerciais de produtores parceiros estrategicamente situados
a vigência desse acordo, ficando em aberto pela indicação dos produtores ao IBPecan.
A expectativa do Pecan 2030 continua sendo a de qualificar os pomares de pecan e atingir entre 25 mil e 30 mil hectares plantados no Brasil nos próximos dez anos? A meta será alcançada?
A parceria entre o IBPecan e a Embrapa busca, mais do que evidenciar números, a qualificação do processo produtivo da pecan brasileira. De nada adianta o avanço da área plantada se não houver a qualificação da produção da fruta em nossos pomares,
para que os produtores tenham melhores condições de produzir com segurança de rentabilidade e de modo mais sustentável, em alinhamento com as exigências do mercado nacional e internacional. A viabilização da produção de forma competitiva no cenário internacional poderá dar condições à pecanicultura brasileira de consolidar sua área plantada e o avanço em termos quantitativos. A busca pelo dimensionamento – atual e futuro – em termos de área plantada, área em produção, capacidade de estocagem e de comercialização interna é tema frágil e crucial de discussão, não só em termos da nossa parceria, mas também de planejamento e estruturação de plano estadual e brasileiro.
Quais são os próximos passos do programa setorial Pecan 2030 a serem colocados em prática?
Creio que o principal desafio é colocar em prática e viabilizar o programa junto aos produtores o mais breve possível. Essa proposta conta com a participação de mais de dez pesquisadores nas diferentes áreas e especialidades, contando ainda com os analistas, laboratoristas e a infraestrutura da Embrapa Clima Temperado. É importante
considerar também que há potencial do projeto encontrar apoio junto à rede Embrapa em todo o Brasil, que conta com mais 42 unidades de pesquisa. Mas é importante ressaltar a necessidade de engajamento dos produtores e dos técnicos envolvidos em cada propriedade. Temos a convicção de que as URPecans poderão, ao longo desses dez anos, fazer a diferença em termos de pesquisa com a cultura no Brasil. Além, é claro, de buscar recursos públicos para a suplementação e a viabilização total da proposta, podendo dar um alento aos recursos financeiros dos produtores para com o projeto.
Quais são os principais desafios ainda a serem enfrentados pelo setor pecanicultor brasileiro nessa caminhada do Pecan 2030?
O principal desafio do setor e do produtor brasileiro está basicamente em se manter unido e institucionalizado na forma de parceria, como, de forma exemplar, vem ocorrendo no IBPecan e em outras associações, como a Associação Brasileira de Nozes,
Castanhas e Frutas Secas (ABNC). Se o produtor ficar isolado em sua propriedade, alheio a todas as ações de desenvolvimento da cadeia produtiva, não poderá usufruir das conquistas, além de enfraquecer o setor em termos de representatividade, de qualificação, de competitividade e substancialmente de rentabilidade da sua produção. Muitos avanços já foram obtidos, mas certamente existem muitos obstáculos a serem superados pela pecanicultura brasileira, os quais incluem a busca da pesquisa como forma de desenvolvimento tecnológico da produção. A pesquisa brasileira com a pecan ainda é recente, mas vem se consolidando de modo a contribuir para posicionamento diferenciado da produção da fruta diante de outras cadeias produtivas e, principalmente, diante de outros países produtores. Vários segmentos agrícolas se desenvolveram e se desenvolvem com o apoio da pesquisa. Vimos recentemente na pandemia que a pesquisa é fundamental para a sociedade. A pecan brasileira necessita de mais investimentos em pesquisa, não só recursos públicos, mas do engajamento de produtores nessa evolução constante de produzir mais, produzir melhor e a um custo financeiro ambiental menor. O pecanicultor precisa estar ciente da ncessidade do seu engajamento em todo o processo. Se ficar sem se envolver, todos sentirão os reflexos.
E quanto à pesquisa em si, alguns desafios mais pontuais da pecanicultura brasileira compreendem os estudos do manejo das plantas x ambiente; zoneamento edafoclimático para as cultivares; programa de melhoramento genético; irrigação, adubação e manejo do solo; controle e manejo de pragas e doenças; práticas para redução da alternância de produção; implementação de sistemas diferenciados de produção com certificação, como a PIPecan (produção integrada de pecan) e a POPecan
(produção orgânica de pecan); aprimoramento da ILPFruti (integração lavoura, pecuária e fruticultura, com foco na pecanicultura); certificação de mudas de qualidade genética e fitossanitária; conservação pós-colheita e agregação de valor.
Confira o vídeo no Youtube sobre o projeto:
Matéria publicada na edição nº 39 do Boletim Informativo IBPecan (fevereiro 2023)
Link da publicação:
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